A sentença n. 44734 de 3 de outubro de 2024, emitida pela Corte de Cassação, oferece reflexões significativas sobre o tema da falsidade ideológica em atos públicos, em particular no que diz respeito à procuração especial para venda. Este caso é emblemático para compreender as dinâmicas legais que envolvem as atestações dos funcionários públicos e o seu impacto na validade dos atos notariais.
Neste caso específico, a arguida, A. L., foi acusada de ter apresentado uma procuração falsa para se qualificar como procuradora especial de um vendedor numa transação imobiliária. A Corte estabeleceu que a conduta do agente integra o crime de falsidade ideológica em atos públicos com fé pública por indução do funcionário público. Isto significa que, com base numa procuração falsamente formada, o agente conseguiu induzir o notário a proceder à compra e venda, acreditando na legitimidade da sua representação.
Procuração especial falsa para venda - Apresentação em sede de escritura notarial - Crime de falsidade ideológica em atos públicos com fé pública por indução do funcionário público - Existência - Crime de falsa atestação ou declaração relativa à identidade ou qualidade pessoal - Exclusão - Razões. Em matéria de crimes de falsidade, integra o crime de falsidade ideológica em atos públicos com fé pública por indução do funcionário público, e não o de falsa atestação ou declaração relativas à identidade ou qualidade pessoal, a conduta do agente que, com base numa procuração falsamente formada, se qualifica como procurador especial do proprietário de um imóvel a vender, induzindo assim o notário a lavrar a respetiva escritura de compra e venda sob o pressuposto da existência real do poder de representação. (Na motivação, a Corte salientou que a pacífica falsidade da procuração, ato com eficácia de fé pública, se transfere para a atestação proveniente do notário que, ao dar conta da existência da procuração para venda, atesta autonomamente a existência de um dado na realidade não correspondente ao verdadeiro).
Esta sentença esclarece que, em caso de procuração falsificada, o crime configura-se como falsidade ideológica, excluindo o crime de falsa atestação ou declaração relativa à identidade ou qualidade pessoal. As razões desta distinção são cruciais para a compreensão das responsabilidades legais de quem utiliza atos falsos para obter vantagens ilícitas. Quando um funcionário público, como um notário, atesta a veracidade de um ato com base numa procuração falsa, ele próprio comete um ato de falsidade ideológica, pois a sua atestação baseia-se num dado não correspondente à realidade.
A sentença n. 44734 de 2024 representa um importante passo em frente na jurisprudência relativa aos crimes de falsidade. Sublinha a necessidade de um rigoroso controlo sobre a veracidade dos atos notariais e sobre a eficácia das procurações, evidenciando como a responsabilidade não recai apenas sobre o agente que falsificou o ato, mas também sobre aqueles que, na qualidade de funcionários públicos, atestam a veracidade de tais atos. A consciência destas dinâmicas é fundamental tanto para os profissionais do setor como para os cidadãos comuns, a fim de proteger a fé pública e a correção das transações legais.