A Sentença n.º 14027 de 2024 do Tribunal de Cassação insere-se num contexto de reflexão profunda sobre a corrupção e o seu impacto na administração pública. Neste caso, o Tribunal abordou o delicado tema da promessa de interferência ilícita por parte de um funcionário público, esclarecendo que nem toda a aceitação de utilidade indevida configura automaticamente o crime de corrupção.
O caso diz respeito a um funcionário da Agência das Entradas, V. G., que recebeu uma quantia em dinheiro prometendo interceder junto de uma colega para o cancelamento de uma hipoteca tributária. No entanto, o corruptor conseguiu posteriormente obter o resultado desejado sem a intervenção ilícita do funcionário. O Tribunal teve, então, de avaliar se a conduta do funcionário público podia ser qualificada como corrupção própria.
Promessa de interferência ilícita na atividade de outro funcionário público - Corrupção própria - Ato "contra legem" - Necessidade - Facto típico. Em tema de corrupção, a mera aceitação por um agente público de uma utilidade indevida como contrapartida de uma interferência ilícita a ser realizada perante outro funcionário público não configura necessariamente o crime de corrupção própria, devendo verificar-se, em concreto, se a "assunção" do interesse do particular corruptor se traduziu na prática de um ato específico contrário aos deveres de ofício, ilícito ou ilegítimo. (No caso em apreço, o Tribunal qualificou como corrupção para o exercício da função a conduta de um funcionário da Agência das Entradas que havia recebido uma quantia em dinheiro prometendo interceder junto de uma colega para o cancelamento de uma hipoteca tributária em favor do corruptor, o qual obteve depois o resultado pretendido autonomamente e de forma legítima).
Esta sentença oferece importantes reflexões, em particular sobre as seguintes questões:
É fundamental compreender que não basta a promessa de uma ação ilícita para configurar um crime de corrupção. O Tribunal sublinha a importância de verificar se houve uma violação concreta dos deveres de ofício.
Em conclusão, a Sentença n.º 14027 de 2024 representa um importante passo em frente na compreensão do fenómeno da corrupção e dos seus mecanismos. Esclarece que a corrupção não pode ser dada como certa, mas deve ser provada através de atos concretos e mensuráveis. Isto convida a uma reflexão mais profunda sobre as responsabilidades dos funcionários públicos e sobre a importância de manter elevados padrões éticos na administração pública.