A imparcialidade do juiz é uma pedra angular de qualquer sistema judicial que se pretenda justo e equitativo. A possibilidade de uma parte recusar um juiz que considere não imparcial é um direito fundamental, tutelado tanto a nível nacional como europeu. Mas quando é que começa o prazo para exercer este direito? A Corte de Cassação, com a sentença n.º 19416 de 29/04/2025 (depositada em 23/05/2025), forneceu uma interpretação crucial que esclarece o momento exato a partir do qual os prazos para a apresentação da declaração de recusa começam a contar, especialmente quando as causas de incompatibilidade surgem fora das salas de audiência.
O nosso ordenamento processual penal, em conformidade com o artigo 111 da Constituição e o artigo 6 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), garante o direito a um processo equo perante um juiz imparcial. Os artigos 37 e seguintes do Código de Processo Penal (CPP) regulam os institutos da abstenção e da recusa, instrumentos essenciais para salvaguardar essa imparcialidade. Em particular, o artigo 37, n.º 1, alínea b) do CPP estabelece que o juiz pode ser recusado se tiver "manifestado indevidamente o seu convencimento sobre os factos objeto da acusação".
A recusa é um ato complexo, sujeito a prazos perentórios, cuja inobservância pode impedir o exercício deste importante direito. O artigo 38, n.º 2, do CPP prevê que a declaração de recusa seja apresentada, sob pena de inadmissibilidade, "no prazo máximo de três dias a contar do conhecimento do facto que determina a recusa". Mas o que se entende exatamente por "conhecimento do facto"?
O caso que levou à pronúncia da Suprema Corte dizia respeito ao arguido D. N. S., num processo em que o Juiz da Relação de Nápoles considerou tardia a solicitação de recusa. A solicitação foi apresentada no prazo de três dias a contar do depósito, ocorrido em audiência, de uma sentença proferida noutro processo pelo Procurador da República C. G., sentença que continha avaliações prejudiciais. Apesar de o Tribunal ter concedido um prazo para a verificação dessas avaliações, a Corte de Relação declarou a solicitação inadmissível por extemporaneidade.
A Cassação, com uma pronúncia autorizada presidida pelo Dr. D. S. P. e com relatora a Dra. C. A., anulou sem remessa a decisão da Corte de Relação de Nápoles, afirmando um princípio de direito de fundamental importância. Eis a máxima integral:
Para efeitos do início da contagem do prazo para a apresentação da declaração de recusa por parte do arguido, quando a causa invocada se refere a eventos ou atos judiciais ocorridos fora da audiência e do processo, deve considerar-se o momento em que a parte interessada adquiriu conhecimento efetivo e integral do mesmo. (Em aplicação do princípio, a Corte anulou a decisão da Corte de apelação que considerara tardia a solicitação de recusa apresentada no prazo de três dias a contar do depósito, ocorrido em audiência, por parte do procurador da república, da sentença proferida noutro processo, apesar de ter sido concedido pelo Tribunal um prazo para a verificação, em concreto, das avaliações prejudiciais expressas na própria sentença).
Este pronunciamento esclarece de forma inequívoca que o prazo de três dias não começa a contar da mera disponibilidade formal do ato, mas sim do conhecimento efetivo e integral do seu conteúdo e, sobretudo, da sua potencial natureza prejudicial. Não basta saber que um ato existe; é necessário compreender o seu alcance para efeitos de recusa. Este princípio já foi afirmado em precedentes conformes (Cass. n.º 41110 de 2013, n.º 19533 de 2014, n.º 39415 de 2019), mas esta sentença reforça a sua aplicação prática.
A Suprema Corte sublinha que, para os eventos ou atos judiciais que ocorrem fora da audiência ou do processo principal, o ponto de partida para o cálculo do prazo é a aquisição de um "conhecimento efetivo e integral" da causa de recusa. Isto significa que a parte deve ser colocada em condições de:
A sentença n.º 19416 de 2025 da Corte de Cassação representa um importante salvaguarda para a imparcialidade da função judicial e, consequentemente, para os direitos do arguido. Reafirma que os prazos processuais, embora essenciais para a celeridade da justiça, nunca podem comprimir de forma irrazoável o direito de defesa e a garantia de um juiz terceiro. Para os operadores do direito, este pronunciamento é um lembrete fundamental: na análise da tempestividade de uma solicitação de recusa, a atenção deve sempre focar-se não apenas na data formal de depósito ou conhecimento, mas na capacidade efetiva da parte de compreender e avaliar o alcance da causa de recusa. Só assim se pode assegurar que o processo penal seja verdadeiramente "justo" em todas as suas fases.