Confisco Direto e Crimes Falimentares: Os Limites do Sequestro Preventivo segundo o Supremo Tribunal de Justiça (Acórdão n. 17718/2025)

No panorama do direito penal económico, os crimes falimentares representam uma categoria de ilícitos de particular complexidade, frequentemente entrelaçados com questões patrimoniais e financeiras. A necessidade de recuperar os proveitos ilícitos, seja para restaurar a legalidade seja para indemnizar os credores, torna as medidas cautelares reais, como o sequestro preventivo e o confisco, instrumentos de fundamental importância. No entanto, a sua aplicação deve sempre respeitar princípios de legalidade e proporcionalidade, como reiterado pelo Supremo Tribunal de Justiça com a sua recente pronúncia.

O acórdão n. 17718 de 30 de abril de 2025 (depositado em 9 de maio de 2025), emitido pela Quinta Secção Penal do Supremo Tribunal, oferece um esclarecimento essencial sobre os limites do sequestro preventivo funcional ao confisco direto do lucro no contexto da falência fraudulenta. Esta decisão, que anulou com reenvio a pronúncia do Tribunal da Liberdade de Florença de 4 de fevereiro de 2025 relativa ao arguido R. L., impõe um travão a interpretações extensivas que poderiam desvirtuar a natureza do próprio confisco direto, transformando-o indevidamente num confisco por equivalente.

O Nexo de Pertinência: O Coração da Questão

O cerne da pronúncia do Supremo Tribunal reside na rigorosa definição do "lucro do crime" e na sua relação com as somas objeto de sequestro. O confisco, disciplinado em geral pelo artigo 240 do Código Penal e especificamente pelo artigo 322 ter c.p. para o confisco por equivalente, visa privar o criminoso das vantagens económicas decorrentes da atividade criminosa. No entanto, nem todas as formas de confisco são aplicáveis a todos os crimes.

No caso dos crimes falimentares, a jurisprudência sempre manteve uma distinção clara. O acórdão em apreço, com a sua máxima, cristaliza um princípio fundamental que é crucial para compreender o âmbito de aplicação do sequestro preventivo.

Em tema de crimes falimentares, o sequestro preventivo funcional ao confisco direto do lucro do crime de falência pode abranger apenas somas de dinheiro relativamente às quais tenha sido apurado um nexo de pertinência com o crime, ou que constituam reinvestimento ou transformação imediata destas últimas, e não já qualquer soma considerada na disponibilidade do autor do facto, sob pena de se resolver num sequestro por equivalente, não consentido para o crime falimentar.

Esta passagem é de capital importância. O Tribunal, presidido por M. G. R. A. e com relator B. P., esclarece que o sequestro preventivo com vista ao confisco direto não pode ser indiscriminado. Não é suficiente que as somas estejam genericamente na disponibilidade do autor do facto (R. L. no caso em apreço) para justificar o seu sequestro. É, sim, indispensável demonstrar um "nexo de pertinência" direto entre o dinheiro e o crime de falência, ou que tais somas sejam o resultado de um reinvestimento ou transformação imediata do lucro ilícito originário. Isto exclui categoricamente a possibilidade de recorrer a um sequestro por equivalente para crimes falimentares, como a falência fraudulenta (disciplinada pelo artigo 216 da Lei de Falências e pelo artigo 223, n.º 2, alínea 2, da mesma lei).

Confisco Direto vs. Confisco por Equivalente: Porquê a Distinção é Fundamental

O confisco direto (ou por desproporção, ou por prevenção) foca-se nos bens que estão intrinsecamente ligados ao crime: o lucro, o produto ou o preço do crime. O confisco por equivalente, por outro lado, permite apreender bens do criminoso de valor correspondente ao lucro ilícito quando os bens diretamente decorrentes do crime já não estão disponíveis. Este último é tipicamente previsto para uma série específica de crimes (como os enumerados no artigo 322 ter c.p.) e não para todos.

A razão desta distinção é profunda e prende-se com os princípios de legalidade e taxatividade das medidas penais. Permitir um sequestro por equivalente para crimes falimentares, para os quais não é expressamente previsto, significaria estender analogicamente uma medida restritiva da propriedade, violando o princípio da reserva de lei. O Supremo Tribunal de Justiça, com a sua pronúncia, reafirma a necessidade de uma aplicação rigorosa das normas, evitando desvios interpretativos que possam prejudicar os direitos patrimoniais sem uma base normativa explícita.

As referências normativas citadas, incluindo o artigo 321 do Código de Processo Penal (que disciplina o sequestro preventivo), reforçam a ideia de que cada medida cautelar deve ser justificada por um quadro legal preciso e por uma atenta avaliação do nexo causal entre o bem e o ilícito.

  • Clareza Jurisprudencial: O acórdão fornece uma orientação clara para juízes e operadores do direito.
  • Tutela do Património: Protege o património do arguido contra sequestros indiscriminados, exigindo uma prova concreta do vínculo entre as somas e o crime.
  • Princípio de Legalidade: Reafirma a importância de aplicar as medidas cautelares apenas nos casos e nas modalidades previstas na lei.
  • Foco no Lucro Específico: Sublinha que o sequestro deve incidir sobre o lucro efetivamente gerado pela falência, ou seu derivado imediato, e não sobre a disponibilidade financeira genérica do criminoso.

Conclusões

O acórdão n. 17718/2025 do Supremo Tribunal de Justiça representa um ponto de viragem na jurisprudência sobre crimes falimentares e confisco. Não só clarifica os limites de aplicação do sequestro preventivo funcional ao confisco direto, como também reforça os princípios fundamentais de legalidade e proporcionalidade que devem guiar a ação judicial. Para as empresas e os empresários, esta decisão oferece maior certeza jurídica, delineando com precisão quais os bens que podem ser objeto de medidas cautelares em caso de contestações por falência. Para os operadores do direito, constitui um importante apelo à necessidade de uma análise rigorosa do nexo de pertinência, evitando interpretações extensivas que possam lesar os direitos fundamentais dos cidadãos.

Escritório de Advogados Bianucci