O direito penal e processual penal é um campo em constante evolução, onde cada decisão judicial pode ter um impacto significativo na proteção dos direitos individuais. Neste contexto, a recente Sentença n. 10424 de 17/12/2024 (depositada em 17/03/2025) da Corte de Cassação, Seção I Penal, presidida pelo Dr. S. V., com relatora a Dra. T. E. e P.M. Dr. A. R., oferece um esclarecimento fundamental em matéria de medidas de segurança, em particular no que diz respeito à liberdade vigiada e ao interesse em recorrer das decisões que a dizem respeito.
A questão abordada pela Suprema Corte, no caso que envolveu o réu G. D., é de grande relevância prática: o que acontece se, após ter recorrido da declaração de executabilidade de uma medida de segurança, esta for posteriormente revogada? O interesse do condenado em prosseguir com o recurso permanece? A resposta da Cassação é clara e protege a posição do cidadão.
Para compreender plenamente o alcance da sentença, é útil dar um passo atrás e enquadrar as medidas de segurança. Estas, previstas pelo nosso Código Penal (art. 199 e seguintes), são providências de natureza preventiva, destinadas a neutralizar a "periculosidade social" de um sujeito. A liberdade vigiada (disciplinada pelo art. 228 c.p.) impõe ao sujeito uma série de prescrições e controlos, pressupondo o apuramento da periculosidade social no momento da aplicação (art. 207 c.p.). No entanto, a periculosidade não é um dado imutável: o art. 208 c.p. prevê que o Magistrado de Vigilância deva reexaminá-la periodicamente e, se esta deixar de existir, a medida deve ser revogada.
O caso examinado pela Cassação versava precisamente sobre uma situação em que o Tribunal de Vigilância de Roma havia rejeitado o recurso de G. D. contra a declaração de executabilidade da liberdade vigiada. No decurso do procedimento de recurso, o Magistrado de Vigilância revogou a medida de segurança, considerando cessada a periculosidade social "ex nunc", ou seja, a partir desse momento. Colocava-se, portanto, a questão se o condenado ainda tinha interesse em contestar a inexistência originária da periculosidade social ("ex tunc").
A Suprema Corte, com a sua pronúncia, afirmou um princípio de direito de fundamental importância, que garante a plena proteção dos direitos do condenado:
Em matéria de liberdade vigiada, o condenado que tenha recorrido da decisão que declarou executável a medida de segurança, alegando a inexistência "ex tunc" da periculosidade social, mantém um interesse concreto e atual no acolhimento do recurso mesmo no caso em que, no decurso do processo, o magistrado de vigilância, reexaminando a periculosidade social nos termos do art. 208 cod. pen., a tenha considerado cessada, com consequente revogação "ex nunc" da medida.
A máxima da Sentença n. 10424/2024 é um exemplo de clareza jurídica. Distingue nitidamente dois momentos e dois efeitos temporais: a contestação "ex tunc" da periculosidade social originária e a subsequente revogação "ex nunc" da medida. Vejamos em detalhe o que significa:
A Cassação sublinha que o interesse em recorrer persiste mesmo em caso de revogação "ex nunc" por diversas razões. Se a periculosidade social não existia "ex tunc", a aplicação da medida de segurança teria sido ilegítima desde o princípio. Apurar esta ilegitimidade originária pode ter consequências significativas para o condenado, que vão além da mera cessação da medida:
Em suma, a revogação "ex nunc" sana a situação apenas para o futuro, mas não apaga o "passado" e as eventuais repercussões de uma aplicação da medida que, desde o início, não deveria ter existido. O direito a obter um apuramento judicial sobre a legitimidade originária de uma providência restritiva da liberdade pessoal é um pilar do nosso ordenamento, reforçado por esta pronúncia.
A Sentença n. 10424/2024 da Corte de Cassação representa um importante baluarte na proteção dos direitos fundamentais do indivíduo. Reafirma que o direito a um pleno apuramento judicial não pode ser esvaziado de significado por eventos supervenientes que, embora melhorem a situação do condenado no presente, não resolvem a questão da legitimidade originária da providência. A clareza com que a Suprema Corte abordou a distinção entre cessação "ex nunc" e inexistência "ex tunc" da periculosidade social é um farol para os operadores do direito e uma garantia adicional para os cidadãos submetidos a medidas de segurança. É um apelo constante à necessidade de um controlo rigoroso e contínuo sobre a subsistência dos pressupostos que limitam a liberdade pessoal, em todas as fases do procedimento.